sexta-feira, 12 de setembro de 2014

CRUZ DAS ALMA - PALCO DE MINHA INFÂNCIA

A cidade Cruz das Almas, no final dos anos 1950, ficava aproximadamente há 6 horas da Capital, Salvador, numa viagem pelo Vapor de Cachoeira, de mais ou menos, quatro horas, além de, mais quase duas horas, subindo por rodovia de chão até lá. Ficava numa gleba de planalto e, no inverno, chegava a fazer um friozinho gostoso pela noite.

Quando eu era menino, ia para lá nas férias, ficava com os queridos tios Clodoaldo e Ivandith, para passar algum tempo brincando com Nadinho. Aliás, não só com ele, mas com toda aquela turma unida, que eram os filhos dos professores da Escola Agronômica da Bahia, onde meu tio, que eu admirava por seus valores morais e intelectuais, era também professor. Ministrava Mecânica Agrícola. Tudo que se refere à mecânica, sempre me fascinou. Os professores moravam todo juntos, num bairro interno da área da escola. Que lugar e pessoas interessantes!

Naquela época, o "campus" era um notável avanço sócio tecnológico, situado naquelas plagas longínquas. Lembro-me que as casas tinham água quente, vinda de equipamento instalado acima do fogão a lenha, usando energia térmica das suas brasas. Produzia água quente para todo o dia e ainda a conservava noite à dentro. Que avanço tecnológico notável, para uma época que a energia de biomassa ainda era muito abundante e barata! Para água de serviço, cada casa tinha um poço subterrâneo, com cisterna e bomba elétrica; A água potável era fornecida por um aguadeiro que percorria regularmente as casas, com um jegue com caçoar às costas, trazendo alguns barris de madeira. Sua qualidade era muito fina e saborosa! Logo após, foi inaugurada uma caixa d'água comunitária, à vista da varanda da casa de Nadinho. A lenha do fogão também era fornecida regularmente por um trator com carreta, da própria escola, ou se a obtinha com facilidade pelas redondezas, até mesmo recolhendo gravetos ou paus secos nos fundos do quintal, com pomar de árvores frutíferas, selecionadas à critério de cada morador. Essas casas tinham ainda um jardim frontal sempre muito bem cuidado. O conjunto era muito harmônico! Na entrada do prédio principal da Escola, havia um extenso jardim pergolado sempre florido. Era orientado pelos professores, especialistas do assunto. Lembro-me do nome de Paternostro, como um dos entusiastas que sempre o comentava.
Nos aspectos sociais, estava o ponto alto daquele excelente convívio, apartado do tumulto que já começava a se avizinhar das grandes cidades. Eu, de fora, me comprazia em ter amigos para brincar soltos na rua! No bairro que eu morava em Salvador, estas proezas eram já impossíveis pela insegurança e trânsito crescentes, com autos e coletivos. Lá, o tempo extra escolar era tomado pelo companheirismo de todos, em “babas”, caçadas para abastecer cozinhados com as meninas, e outras “reinações” parecidas com as encontradas em Monteiro Lobato, um dos meus escritores preferidos na infância. Pensava: eles nem precisam ler, para ter tudo isso presente na vida. Com uma certa ponta de inveja.

Nos festejos juninos, aquele enlaçamento de adultos, crianças e adolescentes era gostoso e enchia minha alma. Ali ensaiei meus primeiros passos em muitas coisas: na fé, com novenas de Sto. Antônio da casa de D.Safira e Dr. Ivan Carneiro, e sua turma de filhos crianças e adolescentes, com a dança e apreciação da boa música nas serestas de Dr. Floriano Mendonça (que vozerio e afinação!), Dr. Conceição (Mestre das cordas), e o adolescente Luiz Fernando - que já ia adiantado na sua arte, além de muitos outros amigos. Os cortejos, de casa em casa, com muita musicalidade e comilança eram motivo de integração e prazer muito grandes. Além da participação inter geracional evidente em tudo, como comentado no caso da música, nunca me esqueço também, de meu irmão, ainda muito pequeno, dançando e contrastando com o porte de D. Leonor Ramos, num par muito curtido por todos.

Numa das visitas, convivi com a época do exame de admissão ao Ginásio Alberto Torres, que Tio Clodoaldo se dedicava paralelamente à Direção. Os dias que o antecediam eram de grande tensão social, cada família torcendo e tentando robustecer a capacidade de seus candidatos, tal o rigor que a contenda era revestida. O corpo docente era integrado significativamente por aqueles professores universitários da Escola Agronômica e suas esposas que, com filhos ainda escolares, “endureciam o jogo” para alcançar qualidade de ensino crescente. Muito justo, procuravam o melhor para todos!

Voltei para morar lá, por dois anos, quando trabalhei na obra da Barragem de Pedra do Cavalo, no final dos anos 1970 e com família já se constituindo. Meu filho mais velho, Bruno Lopes Vieira, veterinário, com quase 40 anos, afirma ter ótimas recordações de lá, onde viveu sua primeira infância e início da alfabetização. Já era uma outra realidade, mas um sabor igualmente prazeroso. Como tenho saudade daquela primeira Cruz das Almas que conheci.

Venho aqui me congratular, além do meu primo Nadinho e da querida Avani que também compartilhava conosco e com todos seus e meus amigos: Flavinho, Deca e Aída, Jackson e Pedrinho, o saudoso Niltinho, seus irmãos Miguel, Jorginho, Ivanira, Aninha e Laurinha, Luiz Fernando, Jonga, a saudosa Carolina e Paulo Sérgio, Jorginho e Cátia, Dino e Lúcia, Zinaldinho, João e Liginha, Luciano, Eraldo, e tantos outros que embora também permanecem dentro do meu coração e com muito apreço, pelo transcurso de quase 60 anos, não consigo recordar todos os nomes.

Minha mulher costuma repetir um dito do pai dela: “Todo Agrônomo que conheço é gente boa”. Estendo o raciocínio; “Laranjeira não dá jaca!” e “Filho de peixe é peixinho”, portanto congratulo-me, neste dia, com vocês e todos que, agradeço, reconhecendo o tanto ajudaram a colorir minha infância.
Paulo Tolentino, 13 de setembro de 2014,  com apoio de Ivanaldo G.  Costa - Nadinho

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O DINHEIRO E SUA “MÁGICA”

A experiência que acumulei e a que reuni me apresentaram uma lição. Parece mesmo que o dinheiro tem uma mágica, a do equilíbrio ao longo do tempo.


Passei a acreditar que o dinheiro, quando é transferido de boa vontade, ou quando é trocado de um modo no qual ambas as partes se sintam em equilíbrio de satisfação, ele frutifica. É como se fluísse acompanhado de uma boa energia desenvolvedora. Como é aquela edificante que acompanha o "dinheirinho suado e merecido".


Alguns exemplos que testemunhei construíram e fortificaram está minha avaliação:


  • Riquezas obtidas como fruto de roubos, ou atos ilícitos do ponto de vista ético ou de legitimidade raramente acabam resultando em bons proveitos para quem os obteve.
  • Poucos são os herdeiros conflituosos que chegam a prosperar com o fruto de seus legados, alcançando prosperidade perene.
  • Excetuando a sustentação normal de filhos, certos artistas notórios ou mesmos pessoas comuns que separadas recebam pensões vultosas dificilmente alcançam os propósitos de realização perene e felicidade. Examinei muitos casos e não tive muitas evidências contrárias.
  • Em mercados livres, os preços dos bens ou serviços, quando exorbitantes, acabam punindo os ofertantes com redução de suas vendas, decorrente de surgimento de concorrentes, por renúncia de compradores ou por outros fenômenos regidos por uma lei econômica chamada de Lei da Oferta e da Procura, que regula naturalmente os preços, nas relações de troca.
  • Os impostos e a tributação, quanto mais escorchantes, menos resultam em notáveis vantagens, para os governos que os impõem e povos que os aceitam. Parece-me que os investimentos necessários para tentar justifica-los e para robustecer desmedidamente um máquina arrecadatória acaba consumindo a maior parte, além da corrupção que acaba se instalando como se fosse para dilapidar a desmedida. A esse propósito, lembro-me do ensinamento da Curva de Laffer 1 que resumidamente mostra que uma arrecadação à alíquotas extremas de 0% ou 100% resultariam em igual valor nulo de resultado. Logicamente, entre esses dois extremos, vários valores significativos existem. Começam crescentes e, a partir de certo ponto, começam a decrescer. Concluo aqui, que,  em alguns povos, esse "fenômeno", natural ou não, acaba por "amaldiçoar" os fluxos de riqueza inapropriadamente direcionados, que condena países de pequena capacidade geradora de riquezas mas com desproporcional carga tributária ao baixo desenvolvimento social.


Por casos como os acima enumerados, chego até mesmo a tentar resistir ao pensamento que  haveria uma força "mágica" a considerá-lo como ganhos "malditos”, não encontrando excessões relevantes. Após refletir e pesquisar sobre que traço comum estaria presente nesses exemplos, sou inclinado entender que; se a utilidade (bem ou serviço) que alguém transfere para outro tem seu valor espontaneamente reconhecido, este valor, ao se transformar em pagamento, tem o condão da representar o equilíbrio, numa troca bem aceita. E por isso, considerado legítimo. E só assim pode contribuir para o sucesso e a felicidade.

1 - Curva de Laffer - publicada pelo Norte Americano  Arthur Laffer e popularizada por Jude Wanniski na década de 1970  (vide verbete específico na Wikipédia)