segunda-feira, 23 de junho de 2014

FESTEJOS JUNINOS

Paulo Tolentino de Souza Vieira
Adm. de Empresas - Aposentado
Depois de muitos anos de afastamento, realizo, junto com minha mulher, um ciclo de três visitas a Senhor do Bonfim, BA., seu torrão natal. Esta é a terceira visita, das três; justamente no seu apogeu anual, os festejos juninos. Diferentemente de muitos dos que daqui emigraram, os que permaneceram já não estão grupados como antes, cada um vivendo interesses, costumes, profissão e núcleos sociais diferenciados. Mas, num reencontro, como estes, quase todos voltam à reintegração. Concluo: a visita de um amigo distante pode oferecer um excelente motivo de reintegração, se vier também com esse propósito.
Estou numa típica cidade de médio porte do interior do nordeste brasileiro, para comemorar, com a máxima autenticidade possível, estes eventos. Melhor lugar e ocasião não poderiam existir!
Os habitantes mais antigos daqui, à título de relato histórico, informam que a cidade foi fundada no final do séc. XIX, mas que seu maior impulso veio a ocorrer nos anos 1920 e década seguinte, com o planejamento urbanístico promovido por engenheiros residentes, concentração muito rara naqueles idos. Como evidência, ainda percebe-se o seu traçado geométrico e espaçoso das ruas e praças públicas do centro histórico.
Naquelas décadas, havia um movimento, no Brasil, pelo desenvolvimento do transporte ferroviário, como principal fator de integração nacional. Esta cidade, que já se evidenciava como pólo de convergência econômica regional, passou a sediar importante centro técnico administrativo do controle regional da ferrovia, criando uma oportunidade para a concentração dos engenheiros, além da proporção comum em cidades semelhantes.
Conheci habitantes que já estavam vivendo aqui, há cerca de 60 anos após sua implantação e, unanimemente testemunharam que,  naqueles  momentos, trafegar pelas suas ruas era coisa muito fácil e prazerosa.
Desde muitos anos "Bomfim" se transformou num dos maiores pólos de animação junina, sendo que mais recentemente veio a agregar, na época desses festejos, outras atrações; como um importante evento do "show business", e feiras: literária regional, de agricultura familiar, artesanato, etc..
O afluxo à cidade se acelerou, multiplicando a sua população várias vezes. Assim, os espaços e serviços urbanos, assim como disponibilidade de hotéis na cidades e arredores tornaram-se preciosos, sendo necessário fazer reservas com antecedência. Os serviços atinentes à iniciativa privad
a se desdobram em quantidade e eficiência para melhor servir aos novos e contumazes vizitantes.

Infelizmente, não é que se pode dizer dos serviços públicos e concessões: a decoração da cidade teve sua conclusão apressada e só terminou na madrugada da véspera do início dos festejos,  a tubulação de esgotamento público, sobrecarregada, insuficiente e frágil acabou estourando e espalhando odor fétido e moscas em toda redondeza.  Passam os dias e nenhum sinal de reparo.  O trânsito engarrafa pela crônica insuficiência de ruas,  característica comum em quase todo o Brasil, trânsito em contra-mão e estacionamento duplo, agravados pela falta de guardas orientadores, pane nos sinais de Internet e telefones celulares. Excessão apenas à Coelba distribuidora de energia elétrica que, apesar das muitas "gambiarras", continuou seu fornecimento sem maiores problemas.
Com a tolerância dada ao "show business", percebe-se, com clareza, uma mudança qualitativamente decadente da autenticidade musical da programação e consequentemente da qualidade musical por conta de um público que valoriza mais o som ruidoso, em detrimento do melodioso e harmônico. Fica claro, para os que buscavam autenticidade temática, este festejo está em processo acelerado de degradação.
À noite avançada, na véspera do dia de São João, voltávamos de uma visita a ex babá de minha mulher e nos deparamos com um cortejo autêntico e típico, como eu conheci, na infância,  noutra cidade do interior da Bahia, onde também está festa é muito evidente, Cruz das Almas:
Os foliões e músicos saem em grupo tocando,  dançando e cantando um repertório geralmente de xaxados, baiões e marchinhas, com letra alusivas aos temas da festas do mês, ou da vida no sertão, visitando as casas dos amigos que, abertas, os esperavam com fartas mesas de comidas à base de milho e amendoim: como cangica (curau), pamonha, bolos de vários tipos, munguzá (cangica) paçoca, além de licores de genipapo e outros.  Em cada casa,  após os comes e bebes, algum, dos mais eloquentes, fazia um agradecimento ao anfitrião (musicado, às vezes é não raro) e rumava para a casa seguinte, até o amanhecer, chovesse ou fizesse sol (ou lua), tal qual faziam, naqueles tempos, e ainda fazem aqui em Bonfim.
Ontem, ao participar de parte daquele cortejo, e hoje me integrando ao "Grupo Caroá" voltei, nostalgicamente ao passado. Saudosismo justificado pela minha triste percepção de que, mesmo no interior, onde buscamos maior autenticidade, o repertório e outras faces do "show business"  começam a miscigenar esses e outros festejos, este, particularmente, neste ano, influenciado pela Copa Mundial de Futebol, aqui no Brasil.
Senhor do Bonfim, BA, 23/06/2014


Um comentário:

  1. O tempo passa inexorável! Pena que leve coisas boas e belas consigo. Tomara que as festas juninas sobrevivam neste novo milênio!
    ML

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